as mãos dele
na minha cabeça
um beijo;
meus membros prostados em atenção na cama
esperando o toque de recolhida
daquele quarto horrível,
com seu cheiro de desinfetante e pele velha,
pintado por dentro do meu nariz
em várias camadas
Dr Carlos, eu disse,
com apenas a menor das hesitações,
num sopro tímido, inócuo,
e:
quando posso ir embora?
não respondeu, tirou as mãos
do meu cabelo oleoso, mal cortado,
as lágrimas queimando sem cair
naquele quarto familiar,
odioso
do corredor vinha o chiado,
um rádio longínquo, irreal,
sertanejo e estática,
rodas velhas se arrastando no linóleo usado,
marcado por uma procissão
de rodas, de doutores Carlos, de pele
e alguém tossia,
não sei se perto do rádio,
um som molhado
"disfarçando as evidências"
a cada pausa
meu próprio fôlego prendia, travava,
esperando o alívio que não vinha nunca
coçando no fundo da garganta, pressionando os seios da face
"mas pra que viver fingindo"
e engasgava com a minha canja morna
quase sem galinha, sem nem os ossos usados,
só os meus próprios ossos,
usados também
e um músculo flácido, uma língua,
preta e grossa,
morrendo
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